Por uma intervenção minimalista
Concluímos hoje a publicação da conferência/debate que se realizou no dia 12 de Dezembro de 2009, na sede do Grupo Pro-Évora sobre o projecto “Espaço Público e Equipamento Urbano para a Acrópole de Évora e Área Envolvente, Acrópole XXI”, com a participação do Prof. Arq.º Gonçalo Ribeiro Telles e da Arq.ª Margarida Cancela de Abreu. Transcrevemos a intervenção da Arq.ª Margarida Cancela de Abreu e uma síntese do debate que se seguiu. Havíamos anunciado a presença do autor do projecto, o Arq.º Nuno Lopes, que entendeu não estar presente.
Conferência/Debate Arq.ª Margarida Cancela de Abreu GPE 12.12.2009
(..) Para mim é uma honra estar ao lado do Arq.º Ribeiro Telles, com quem trabalho, tem sido meu mestre, não na Universidade, mas na vida, há mais de quarenta anos, (...). Também pela assembleia que aqui está (...), o Arq.º Ribeiro Telles é o presidente da Assembleia Geral da Associação dos Arquitectos Paisagistas Portugueses, eu sou a Presidente da Direcção, nós não conseguimos uma assembleia destas na nossa Direcção, somos 900 membros e não conseguimos reunir este número de pessoas.
A primeira questão (...) é que não consigo perceber, nem nos documentos que nos foram apresentados, se há uns termos de referência para este concurso [Espaço Público e Equipamento Urbano para a Acrópole de Évora e Área Envolvente, Acrópole XXI], o que é que esses termos de referência diziam. O que é que se pretende? Alterar e intervir na Acrópole, como é chamado este lugar, mas qual foi a referência dada aos concorrentes?
(...) Há de facto uma justificação para se intervir neste sítio, neste local? Se houver identificação de disfunções, aspectos a corrigir, algum obstáculo à nossa fruição do Templo Romano, daquela Acrópole, então deve haver lugar a uma alteração do que lá está. Mas o mais importante para mim, é o que é que os Eborenses, o que é que os especialistas na valorização do património (...) identificam que há a alterar naquele lugar. O que é que pensam, o que é que disseram, reflectiram sobre a Acrópole, o que é que de facto se pretende com esta intervenção? (Muitos dos presentes sabem que houve aqui, nesta sala, posições públicas sobre aquele plano estratégico que foi elaborado para Évora, houve um fórum, no sentido romano, que o Grupo Pro-Évora assumiu, promovendo essas discussões, incentivando as pessoas a vir, esteve sempre esta sala cheia, esteve sempre presente a Câmara Municipal, o presidente da Sociedade de Reabilitação Urbana, ouviram, estiveram aqui).
Na minha qualidade de quem trabalha desde 1961 nesta área, no ordenamento do território, planeamento urbanístico, etc., fizemos um esforço enorme, desde o tempo em que o Arq.º Ribeiro Telles foi Sub-Secretário de Estado do Ambiente, em 1974, até Ministro da Qualidade de Vida, em 1983, desde aí temos feito um esforço enorme na legislação – Portugal é considerado por ter uma boa legislação urbanística e eu quero dizer aqui muito claramente que a legislação actual prevê, obriga à intervenção do público desde o início.
Antes da apresentação, é obrigada a entidade que adjudica, a publicitar o que se vai fazer e a ouvir, portanto receber (não é mera audição formal) contributos dos Eborenses, dos especialistas e dos não especialistas, das pessoas que têm, de facto, interesse neste local, interesse técnico ou interesse afectivo, etc.
(...) Nós queremos a mudança e o Arq. Ribeiro Telles tem ensinado isto na Universidade de Évora, a paisagem sempre mudou, não é drama nenhum a paisagem mudar, a paisagem urbana ou a paisagem rural, sempre soubemos construir paisagens, no verdadeiro sentido do termo construir. Agora o que nós gostaríamos era de uma mudança ponderada, que melhore o que está, não para justificar uma verba que foi adjudicada, concedida, e nunca uma mudança sem debate, sem audição das pessoas (...). Eu não concebo que um técnico “sozinho” (...) altere espaços emblemáticos de uma cidade milenar, como já foi o caso do Jardim das Canas.
(...) Nós dois combinámos que não vamos entrar nos pormenores dos degraus, das rampas (...), do que nós na Universidade de Évora chamamos “guardanapos de relva”, ou das esculturas de maior ou menor dimensão que são distribuídas no espaço envolvente da Acrópole, no espaço de intervenção. Vamos aos princípios, que é o que gostaríamos de discutir aqui hoje, não nos vamos debruçar sobre os pormenores e muito menos sobre os remendos (...).
Portanto, já o Arq.º Ribeiro Telles o disse, trata-se de uma zona emblemática da cidade, este local é um imaginário que não é dos eborenses, é muito mais, é do país, não sei se é internacional, mas do país é seguramente, portanto tem um âmbito muito mais vasto do que [se supõe] (...).
Ora bem, em sítios especiais, o que se tem defendido é uma intervenção mínima, minimalista, a quase não-intervenção. É o mais adequado, a não ser que existam as tais disfunções graves ou aspectos que estão ali a competir (eu penso que talvez existam) com o Templo Romano que nós queremos gozar, que nós queremos contemplar, que nós queremos fruir. Se houver, vamos corrigir esses aspectos, mas só aqueles que nos retirem a fruição plena, o sossego, o silêncio, a quietude daquele lugar, para podermos percorrê-lo, contemplá-lo. Então, esses sim, esses aspectos terão de ser identificados e corrigidos. Era essa a minha pergunta, a questão que vejo e não temos muita gente para responder a isto. Antes de intervir, isto obrigaria evidentemente a um estudo muito aprofundado sobre qual é que era a situação original – como já vimos, o templo está sobre uma colina a dominar a cidade, mas qual era a situação? (...) Qualquer intervenção deve caracterizar-se pela maior simplicidade possível, evitar tudo o que interfira com o simbólico do lugar, com o templo.
Importa também saber o que recomenda o Plano de Urbanização para este local e o que prevê a legislação patrimonial (...). Para finalizar, há que ter em conta o que disseram (e dizem) os Eborenses e os especialistas.
Debate
Depois das intervenções dos oradores convidados, seguiu-se um debate aberto a todos os presentes. Damos conta das ideias avançadas pelos diversos participantes, de forma sintética. Várias opiniões consideraram que o assunto não pode ficar apenas reduzido à intervenção dos especialistas, dada a importância da vivência pública do local. Por exemplo, o Jardim de Diana mereceu uma crítica quanto à qualidade do seu arranjo actual, mas diversas intervenções de frequentadores desse espaço manifestaram que o mesmo é muito utilizado por residentes e por turistas, constituindo um espaço de lazer importante no Centro Histórico, que deve ser melhorado, mas não destruído, como o projecto pretende. A própria pertinência da dimensão do projecto foi questionada pelo facto de constituir mais um aproveitamento de verbas disponíveis do que uma resposta a necessidades de intervenção tão profundas, que não existem. O Prof. Ribeiro Telles considerou que este projecto não está em sintonia com o que se está a passar com as cidades em geral, que se assumem como cidades-região, e reafirmou que nele não surge a ideia de futuro. A Arq.ª Margarida Cancela de Abreu questionou se, com a intervenção prevista, se acrescenta algum valor simbólico ao valor do templo, pois destacá-lo não é o mesmo que dignificá-lo, alertando ainda para o problema da drenagem das águas, pois desconhecem-se as consequências que terá nos quintais e poços da Mouraria a enorme placa de lajes de granito projectada. Foi realçada a importância histórica e típica das calçadas de Évora, que o projecto pretende eliminar, em vez de se limitar a intervenções pontuais que beneficiem a mobilidade dos peões. Houve críticas à ambição de projectistas que não se inibem de transformar profundamente zonas ou locais históricos sensíveis, alheados das ligações afectivas e funcionais dos mesmos, que ignoram. Por exemplo, foram referidas a transformação do espaço contíguo ao templo em “sala de espectáculos”, eliminando a simples fruição do espaço, substituindo o turismo cultural, que constitui a mais-valia da cidade de Évora, pela submissão ao turismo de massas, que pode por em causa a sua atractividade futura, e a transformação do templo num “bibelot” a decorar um plano lajeado. Foi manifestada a preocupação pela confusão entre a valorização de um espaço e a sua alteração radical, bem como a conveniência absoluta em ligar o valor edificado ao natural, no que são fundamentais os espaços verdes. A lógica que orienta estas intervenções não pode ser casuística, como parece acontecer no caso presente. O Dr. Filipe Marchand, referindo-se a questões estratégicas de enquadramento do Centro Histórico, considerou que os dez milhões de euros da Acrópole XXI seriam mais úteis noutro local que dinamizasse o tecido urbano da cidade. «O que faria sentido era encomendar a reformulação do Jardim de Diana, fazer uma intervenção localizada ali e pouco mais», disse. Também afirmou que o excesso de lajeamento previsto é um erro a evitar, transformando tudo o que está na cidade em cinzento dificilmente visível. «É mesmo um excesso!» Ainda a propósito do jardim e do estacionamento automóvel, recordou que há cerca de vinte anos, quando tinha responsabilidades no Gabinete do Centro Histórico da Câmara Municipal, o assunto foi muito discutido e surgiu a ideia de uma rampa, em substituição do aterro que suporta o jardim. Outras intervenções salientaram o desconhecimento em relação às consequências dos debates públicos realizados e a ausência de discussão das soluções decididas pelo poder autárquico. O caso da deslocação da estátua do Dr. Barahona, paga por subscrição pública, foi referido, não porque ela não possa ser efectuada, mas por não serem aceitáveis os critérios utilizados. No âmbito do projecto global Acrópole XXI, foi questionada a atribuição de cerca de um milhão de euros para uma marca a criar, que não foi explicada pelos responsáveis. A finalizar, o Prof. Ribeiro Telles disse que «há aqui um problema básico que veio ao de cima: Évora nasceu num lugar dominante, tem uma génese de estruturação orgânica, uma relação constante de planos com frestas, uns para os outros. Não podemos pensar na Acrópole sem pensar na totalidade da cidade». Retomando a intervenção do Dr. Filipe Marchand, defendeu como hipótese a transformação do Jardim de Diana num jardim em socalcos, conferindo ao templo uma visibilidade e uma valorização paisagística coerente com a morfologia do local – «a Acrópole faz parte de um sistema morfológico do terreno. O projecto é contra-natura! Uma plataforma sobre a realidade, que é o que está por baixo». No seu entender, o projecto devia ser revisto com uma atitude mais corajosa, eliminando a plataforma «e nada de alinhamentos arbóreos!» O «radicalismo da proposta» não é compatível com Évora, disse ainda a Arq.ª Margarida Cancela de Abreu, considerando também que o primeiro passo para acabar com um jardim é danificar as árvores, como sucedeu no caso presente. Quanto ao problema do estacionamento, afirmou que o debate, hoje, é sobre a compatibilidade do automóvel com o património – e todos devemos «aprender com o património». Concluiu considerando que, se o projecto é tão polémico, como o debate mostrou, então «deve haver mais reflexão e ponderação», sem pressa em encontrar uma solução, secundando opiniões no mesmo sentido anteriormente feitas.
"Guia de Escultura da Cidade de Évora"
Esta edição bilingue (português/inglês) localiza e identifica cerca de 50 esculturas públicas. Com fotografias de Paulo Nuno Silva, mapas, fichas técnicas e textos introdutórios de Maria do Mar Fazenda, são propostos três percursos temáticos - Percurso Evocativo, Percurso Simpósio ’81 e Percurso (Re)Pensar a Cidade – que dão visibilidade e leitura às peças instaladas na cidade.
Este livro está disponível na sede do Grupo Pro-Évora
"Pela Biblioteca Pública"
Remonta a 1992 a intenção declarada, por parte dos responsáveis pela cultura em Portugal, de dividir a Biblioteca Pública de Évora, uma das mais notáveis do pais. Desde logo o Grupo Pro-Évora iniciou uma campanha de defesa desta instituição, a semelhança do que fizera aquando da sua fundação.
de Celestino Froes David e Marcial Rodrigues
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