É urgente a conservação da Igreja da Graça de Évora

Colecção do Grupo Pro-Évora, fotografia de 1890/1920

Colecção do Grupo Pro-Évora, fotografia de 1890/1920

 

O estado de conservação da fachada e da cobertura da Igreja de Nossa Senhora da Graça, um ex-libris da cidade de Évora, necessita de urgente intervenção de conservação.

 

Degradação dos “Meninos da Graça”

Apesar de não ser visível pela tomada de vistas da perspectiva inferior (aquela que qualquer cidadão poderá realizar), verificou-se, numa vistoria efectuada há cerca de uma década, que os elementos pétreos que compõem a fachada estão em clara desagregação. As quatro esculturas dos Atlantes, por exemplo, apelidados pelos eborenses como os “Meninos da Graça”, arriscam diariamente a sua integridade, faltando já partes das argamassas que os envolvem, sendo visíveis as estruturas metálicas que os sustentam – de facto, não há memória de terem sido realizadas intervenções de conservação dos elementos escultóricos da fachada nos últimos 40 anos. Por outro lado, os pombos nidificam na Igreja – no que parece ser um problema generalizado da cidade sem resposta adequada –, entupindo o sistema de drenagem de água.

 

Preocupado com a situação, o Grupo Pro-Évora (GPE) alertou os responsáveis pelo monumento, afectado ao Exército/Ministério da Defesa Nacional, e a Direcção Regional de Cultura do Alentejo (DRCA) em 2021 e nos anos seguintes, solicitando informação sobre a existência de eventuais projectos de conservação e disponibilizando-se para lançar uma campanha de subscrição pública para angariação de fundos para as obras. Em reunião ocorrida no corrente mês de Abril, o Director de Formação do Exército, Major-General Vítor Dias de Almeida, esclareceu a Direcção do GPE acerca do processo iniciado em 2023 visando a conservação do monumento, em parceria com a DRCA, hoje integrada na Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Alentejo, a Arquidiocese de Évora, o Turismo de Portugal e a Câmara Municipal de Évora. Está em preparação a apresentação de uma candidatura ao Turismo de Portugal para financiamento de 70% dos custos da intervenção, cujo orçamento ultrapassa as disponibilidades do Exército. A nomeação de Évora como Capital Europeia da Cultura em 2027 também constitui um importante incentivo para a realização da recuperação da fachada e da cobertura da Igreja da Graça. Na mesma reunião, o GPE manifestou a sua disponibilidade para colaborar naquilo que os responsáveis entenderem adequado e para continuar a chamar a atenção para a urgência da intervenção. O GPE vem dar conhecimento público deste processo, na expectativa de que sejam ultrapassadas as dificuldades que afectam a concretização do projecto de recuperação deste monumento emblemático do património eborense, também Património Mundial.

 

Afirmação de Évora no Renascimento em Portugal

 

Évora ocupou um lugar ímpar no Renascimento português. Foi capital do reino durante grandes períodos, quando a Corte ainda mantinha características itinerantes, típicas do período medieval, estanciando em Évora e atraindo toda a sorte de artistas, artífices e intelectuais, que, de forma indelével, deixaram o seu legado patrimonial.

 

A Igreja de Nossa Senhora da Graça é um monumento que se integra neste período, a que nenhum cidadão fica indiferente, e pertenceu ao mosteiro dos frades eremitas calçados de Santo Agostinho, fundado em 1511. Foi projectada pelo arquitecto da Casa Real Miguel de Arruda, tendo colaborado no projecto o escultor Nicolau de Chanterenne e, muito provavelmente, o humanista André de Resende. A edificação do actual conjunto da Igreja e Convento de Nossa Senhora da Graça decorreu entre 1536 e 1546.

 

Apesar dos atentados à sua integridade, de que padeceu ao longo do tempo – entre outros, foi bombardeada em 1663 no contexto da guerra da Restauração e sofreu o desabamento da cobertura em 1884 –, a igreja nunca perdeu a beleza do seu programa escultórico, de que se destacam os quatro “Meninos da Graça”. As esculturas que compõem a fachada, exemplo único na arquitectura nacional da época, correspondem às primeiras manifestações do Maneirismo em Portugal, alinhadas com a melhor reinterpretação da arquitectura e iconografia romanas. Historiadores de Arte, como Manuel Branco ou Rafael Moreira, encontram no desenho desta igreja alguns dos princípios arquitectónicos que teóricos ilustres, como Sebastiano Serlio e Diego de Sagredo, descreveram nos seus tratados.

 

O reconhecimento do valor cultural e do interesse histórico e arquitectónico desta igreja ficou bem patente na precocidade da sua classificação, pois foi um dos primeiros imóveis a ser classificado como Monumento Nacional (Decreto de 16/06/1910). O Convento e Igreja da Graça está afectado ao Exército/Ministério da Defesa Nacional.

 

Com a extinção da Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais em 2007, desapareceu a conservação preventiva dos monumentos classificados do Estado, como é o caso da Igreja de Nossa Senhora da Graça de Évora, mas também, e com maior gravidade, a própria responsabilidade pública pela sua salvaguarda. É tempo de os responsáveis olharem para a conservação do património como uma obrigação constitucional – que o é! – e não como um custo.

 

Reportagem da SIC sobre a iniciativa do GPE, emitida em 17 de Maio

 

 

1919-2019

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"Em 16 de Novembro de 1919 foi formalmente fundado o Grupo Pro-Évora. Até hoje, somam-se mais de cem anos de actividade em defesa do património e de valores culturais da cidade de Évora." A Direcção

 

"Escultura no Pátio"

Situado na Rua do Salvador, o pátio da sede do Grupo Pro-Évora recebe projectos de intervenção artística no domínio da escultura desde a década de oitenta do século passado. Este espaço revela características muito particulares em termos arquitetónicos, quer pela exposição de parte da muralha fernandina da cidade, quer pela relação reservada enquanto espaço público. Por aqui já passaram mais de duas dezenas de instalações artísticas de vários autores portugueses e estrangeiros. Apresentamos um breve olhar sobre as últimas obras aqui expostas.